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RASTREABILIDADE DOS ALIMENTOS
DECO - ProTeste
29-12-2004

Vacas loucas, nitrofuranos e bactérias perigosas para a nossa saúde… Nos últimos anos, os escândalos alimentares abalaram a confiança dos consumidores. Por isso, são cada vez mais os que se interrogam sobre a origem do que compram e consomem. Reconquistar a confiança dos consumidores europeus é uma das principais missões da Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos. Para assegurar a qualidade dos produtos, definiu-se como prioritária a implementação de sistemas de rastreabilidade, através do uso de tecnologias que permitem o registo completo do ciclo do produto. Façamos o ponto da situação.

Rastreabilidade: um projecto à escala europeia
Apoiado pela Comissão Europeia, este projecto foi realizado em conjunto com as associações de consumidores nossas congéneres da Bélgica, Espanha e Itália. Os nossos objectivos foram desenvolvidos em quatro fases:
„h Pesquisa. Estabelecer um inventário, o mais representativo possível, dos sistemas de rastreabilidade existentes nos sectores da carne, fruta e legumes. Tal foi feito em colaboração com as autoridades, federações de produtores e de distribuidores, bem como com as próprias empresas.
„h Análise. Estudar os diferentes sistemas para tirar a devida lição de cada um. Quais são os princípios de base? Como garantem uma maior segurança alimentar? Quais as suas particularidades? Em que medida são úteis para o consumidor?
„h Recomendações. Propor à União Europeia medidas independentes, claras e objectivas, que permitam estimular e desenvolver, mas também harmonizar os vários sistemas.
„h Informação. Informar associações e outras instâncias, bem como os consumidores, das conclusões deste projecto.

Os CiberConsumidores
Os consumidores pretendem saber de onde vem aquilo que consomem, mas também o percurso seguido, e de preferência, do início ao fim. Mas será que sabem o que é a rastreabilidade? Neste sentido e também para conhecer as suas dúvidas, é importante estarmos atentos à opinião dos consumidores.
Por isso mesmo, entre Abril e Junho, fizemos um inquérito através do nosso sítio na Net. No total, obtivemos cerca de 700 respostas. A maioria dos ciberconsumidores revelou estar a par do significado da expressão e ter alguns conhecimentos nesta matéria. Mais de metade (58%) responderam que se trata de uma “garantia de acompanhamento da produção até ao nosso prato”.
Questionados sobre a importância de várias informações, a data de validade está no primeiro lugar das suas preocupações, mas também dão grande destaque ao percurso completo do alimento, bem como aos nomes e moradas dos produtores e distribuidores.
A terceira questão relacionava-se com o local onde o consumidor deseja encontrar essas informações e também não houve dúvidas. A esmagadora maioria (97%) prefere que apareça nos rótulos e, no caso dos produtos a granel, por outro meio facilmente visível e colocado na sua proximidade (nas prateleiras, por exemplo). No final, quisemos saber se os cibernautas tinham conhecimento de algum sistema de rastreabilidade: 83% dos inquiridos disseram-nos que não conhecem nenhum sistema de rastreabilidade. Os que responderam positivamente apontaram o caso da carne bovina, obrigatório por lei.

Sistema de Rastreabilidade
A rastreabilidade é, segundo a norma internacional, a capacidade de conhecer o histórico, a utilização ou a localização de um artigo ou de uma actividade, através de meios de identificação registados. Na prática, traduz-se na possibilidade de situar e identificar o produto em cada uma das suas etapas e passa pelo acompanhamento através dos dados registados ao longo de toda a fileira produtiva, até ser colocado à venda.
Para os industriais, é a possibilidade de encontrar rapidamente os lotes suspeitos e reduzir o impacto de uma eventual crise. Para os consumidores, é a esperança que, em caso de problemas, os produtos perigosos sejam retirados de venda e a informação seja divulgada. É, também, a única forma de ter a certeza da ausência de elementos que não deseja consumir, como os organismos geneticamente modificados (OGM), por exemplo.
Para responder a estes objectivos, um sistema de rastreabilidade deve:
„h englobar um mínimo de obrigações que devem ser respeitadas por todos os elementos da cadeia (produtores, industriais, etc.);
„h estar adaptado a todas as etapas da cadeia, em função das respectivas particularidades;
„h obrigar à implementação de um sistema de identificação e registo de dados para cada uma etapa;
„h estabelecer uma ligação entre os diversos elementos. Também estes devem assegurar que os respectivos fornecedores funcionam segundo os mesmos princípios;
„h funcionar tão bem a jusante (para podermos recuar na cadeia), como a montante (os fabricantes devem ser capazes de identificar que produtos foram vendidos, a quem e quando);
„h permitir que todas as informações estejam disponíveis, a qualquer momento;
„h oferecer ao consumidor a segurança de uma informação fiável.
Em suma, tudo assenta sobre a transparência da informação e a responsabilização dos diferentes agentes, que devem prevenir as autoridades assim que suspeitam de um produto perigoso. A rastreabilidade é, assim, uma boa ferramenta na gestão de crises. Não garante a segurança alimentar máxima, mas contribui para uma maior transparência nos controlos que devem ser feitos.

Enquadramento legal
As crises alimentares sucessivas fizeram as autoridades tomar consciência da necessidade de uma legislação sobre esta matéria. Em Janeiro de 2000, a Comissão Europeia publicou um Livro Branco sobre a segurança alimentar, aconselhando os países da União a:
„h adaptar a sua política em matéria de segurança alimentar para atingir um elevado nível de protecção da saúde dos consumidores;
„h desenvolver um sistema de rastreabilidade completo e fiável.
Desde 2002, estas recomendações foram concretizadas em nova regulamentação para este sector, onde se determinam os princípios e normas gerais da legislação alimentar e se estabelecem procedimentos em matéria de segurança dos géneros alimentícios.

Objectivo: a harmonização das diferentes legislações ao nível dos géneros alimentícios, bem como da sua aplicação nos diferentes Estados-membros, e o desenvolvimento de sistemas de rastreabilidade, tendo em conta toda a cadeia alimentar (desde o prado ao prato). Tal implica:
„h a rastreabilidade dos géneros alimentícios, dos alimentos para animais, dos animais produtores de géneros alimentícios e de todas as matérias destinadas a ser acrescentadas em qualquer género ou num alimento para animais, em todas as fases da produção, transformação e distribuição;
„h que os operadores das empresas do sector alimentar e de alimentos para animais estejam em condições de identificar os seus fornecedores e, por outro lado, de dispor de sistemas e procedimentos para identificar outros operadores a que tenham sido fornecidos os seus produtos. Para tal, devem dispor de sistemas que permitam disponibilizar estas informações a qualquer momento, a pedido das autoridades competentes;
„h os géneros alimentícios e os alimentos para animais colocados à venda, ou susceptíveis de o ser, devem estar adequadamente rotulados ou identificados, de modo a facilitar a sua rastreabilidade, através de documentação ou informação.

A partir de 1 de Janeiro de 2005, a rastreabilidade será obrigatória para toda a cadeia alimentar.


Iniciativas públicas e privadas
A implantação de sistemas de rastreabilidade varia de país para país. Numa primeira fase, contactámos organismos certificadores, associações, o sector da grande distribuição e as cadeias mais importantes de comida rápida. De seguida, apresentamos-lhe uma ficha para algumas das iniciativas existentes no nosso país. Não se trata de um inventário exaustivo, mas de um retrato de alguns exemplos do que está a ser feito entre nós a este nível.
Nalguns casos, não obtivemos respostas que descrevessem claramente o sistema de rastreabilidade. Para esses, não criámos uma ficha específica. Foi o caso de algumas empresas do sector das aves e das grandes superfícies.

Sistemas de rastreabilidade:
„h Carne de bovino
„h Rotulagem da carne de suíno
„h CODIPOR
„h GRANFER
„h Comida rápida

Recomendações
Sejamos realistas: a rastreabilidade absoluta jamais será possível. Os produtos que consumimos são cada vez mais elaborados e contêm ingredientes de origens tão diversas, que tornam a sua rastreabilidade difícil.
Já existe um enquadramento legal, mas as empresas do sector alimentar têm a obrigação de se preparar para efectuar um autocontrolo permanente e trabalhar no sentido de uma cada vez maior transparência e de prevenir as autoridades, assim que suspeitarem de problemas.
Assim, para que a rastreabilidade seja verdadeiramente uma mais-valia, é preciso que:
„h os sistemas implantados sejam práticos e acessíveis do ponto de vista económico, ou seja, para pequenas e grandes empresas;
„h estes sistemas estejam adaptados à realidade de cada sector e país, mas, ao mesmo tempo, haja uma harmonização dentro da União Europeia, para que sejam facilmente compreendidos por todos os intervenientes em caso de crise. Dentro do mesmo sector, os sistemas devem ser o mais similares possível, pois só assim os sistemas de alerta internacionais podem ser eficazes;
„h as autoridades comunitárias e o Ministério da Agricultura controlem tanto as iniciativas públicas como as privadas e, quando necessário, apliquem penalizações dissua soras ;
„h que a rastrebilidade não traga nenhum custo complementar para o consumidor. Se os riscos forem bem geridos, as inúmeras crises serão evitadas, bem como os custos astronómicos que estas implicam;
„h que toda a utilização para fins publicitários seja interdita.

Em suma, é preciso fazer tudo para que esta história não seja apenas um processo de boas intenções. Não se trata de um instrumento da moda, mas antes de uma aposta séria.


(Trabalho desenvolvido pela Associação de Consumidores DECO que aqui fazemos divulgação e devida publicidade)
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